A Função do Psicanalista: Entre a Escuta e o Desejo

A escuta como fundamento da psicanálise
Sigmund Freud estabeleceu a escuta como pilar da clínica psicanalítica. Em Sobre o início do tratamento (1913), ele destaca que o analista deve permanecer em silêncio para que o paciente revele conteúdos inconscientes. Dessa forma, a função do psicanalista não se reduz à neutralidade, mas envolve uma atenção flutuante, captando lapsos, sonhos e atos falhos. Esses elementos, segundo Freud, são manifestações do inconsciente que demandam interpretação.
Jacques Lacan ampliou essa visão, afirmando que o analista deve “sustentar o desejo”. Contudo, isso não significa impor uma direção, mas ocupar um lugar vazio que provoca questionamentos. Assim, a função do psicanalista torna-se uma provocação ética, convidando o sujeito a confrontar suas próprias contradições.
O analista e o objeto do desejo
Na teoria lacaniana, o analista opera como objeto a, um significante do desejo que nunca se completa. Por isso, sua presença é paradoxal: ele atua como um espelho vazio, refletindo as projeções do paciente sem se identificar com elas. Desse modo, a função do psicanalista não é oferecer respostas, mas manter um espaço onde o sujeito possa questionar-se.
A transferência, fenômeno central na psicanálise, surge justamente dessa dinâmica. O paciente atribui ao analista saberes e afetos inconscientes, mas cabe ao profissional manejar isso sem cair em armadilhas. Portanto, a função do psicanalista exige rigor ético, evitando interpretações autoritárias e privilegiando a singularidade de cada caso.
A ética psicanalítica e a autorização do analista
Lacan afirma que “o analista só se autoriza de si mesmo”, destacando que não há garantias externas para essa prática. Em outras palavras, a função do psicanalista depende de sua própria análise e supervisão contínua. Diferentemente de outras profissões, a psicanálise não se baseia em manuais, mas na capacidade de sustentar incertezas e enigmas.
Além disso, o analista não busca adaptar o sujeito à norma, mas acompanhá-lo em sua jornada subjetiva. Por isso, a função do psicanalista é, acima de tudo, um ato político: resistir às pressões sociais que tentam uniformizar os desejos.
Conclusão: a psicanálise como travessia
A função do psicanalista não se encerra em técnicas ou teorias, mas em uma aposta na singularidade. Seu papel é facilitar um encontro do sujeito com seu inconsciente, sem atalhos ou certezas. Embora desafiadora, essa prática transforma tanto o paciente quanto o profissional, revelando que o desejo é sempre um território a ser explorado.
Referências bibliográficas:
- FREUD, Sigmund. Sobre o início do tratamento. Companhia das Letras, 2010.
- LACAN, Jacques. A direção do tratamento. Zahar, 1998.
- LACAN, Jacques. Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola. Zahar, 2003.